Patrício, Paulo.    "Espanha – Sangue Novo" ["Spain's New Blood"].  Quadrado 3.2 (October 2000).



NOTE: This essay originally appeared in Quadrado and appears at ComicsResearch.org through the courtesy of its author.
English Summary: In the last to years Spain number of new comic book artists and editions have reached an amazing level of quality and quantity.
This article traces the last two years history, pointing out the most impressive names of the new generation of cartoonists: Sergio Córdoba, Juaco Vizuete, Calo, Javier Rodriguez, Ramon F. Bachs, Paco Alcazar, Jóse L. Agreda, Maria Colino e Alex Fito. Describing their drawing styles – in most cases a natural fusion between American underground and Japanese manga – and the subject of the stories – urban love, sexual life, violence and rock & roll. Also includes a small biography of each one.

Espanha – Sangue Novo

Nos dois últimos anos o número de títulos em Espanha tem crescido bastante, isto a todos os níveis, desde os nacionais até aos estrangeiros. Um exemplo da boa temporada que o mercado está atravessar é a quantidade de autores americanos, ditos independentes, que estão traduzidos para castelhano: Daniel Clowes, Peter Bagge, Robert Crumb, Jason Lutes, Seth e Chester Brown, para citar alguns. Há ainda que acrescentar outra informação, ainda mais positiva, são todos editados em séries regulares. Não é por isso de estranhar que os novos autores espanhóis transportem no estilo características destes autores, e também doutros, como os japoneses, já que o manga em Espanha é um segmento de mercado que não mostra sinais de debilidade. Os novos autores espanhóis têm em comum o facto de terem quase todos publicado em editoras independentes, como a Subterfuge Comix ou Under Comics, avançando mais tarde para editoras médias ou grandes, como La Factoría de Ideas, La Cúpula ou Norma, e de colaborarem regularmente em revistas nossas conhecidas, como El Víbora ou La Comictiva. Se isto se deve  em parte ao crescimento invulgar que o mercado espanhol tem tido nos últimos anos, por outro também deve muito à capacidade que os novos autores tiveram de ir ao encontro dos leitores, e a uma indústria capaz de acolher, gerir e encaminhar os novos valores. Em suma, renovação e agressividade que vieram agitar mercados latentes, estejam eles num nicho ou, pura e simplesmente, adormecidos. Há ainda a acrescentar outros dois elementos, que correm lado a lado com a indústria, o dos organismos estatais e o das revistas generalistas, se os organismos estatais pautam-se pelo apoio e divulgação sistemática, preferindo autores com qualidade e produção regular a autores pontuais, as revistas generalistas investem em ilustradores, promovendo-os à exaustão, veja-se o caso de Gallardo.

A maior parte dos novos autores espanhóis têm referências estilísticas evidentes, principalmente aquelas que vêm dos independentes americanos e dos mangas contemporâneos, cruzando também estes dois estilos, ou apenas um deles, com o franco-belga. Assim, na maior parte dos casos, estamos perante um estilo de fusão, próprio das novas gerações europeias, ao qual alguns novos autores portugueses também não escapam. A temática geral centra-se na vida sentimental e sexual, desenvolvendo-se quase sempre à volta de universos característicos e bem definidos, como por exemplo: a universidade e as bandas rock. Quando não são esses os universos ou a temática, surgem-nos outros aos quais a idade dos autores também está associada: o primeiro emprego, a saída de casa, etc. Assim, e representativos daquilo que são os novíssimos autores, temos Sergio Córdoba, Juaco Vizuete, Calo, Javier Rodriguez, Ramon F. Bachs, Paco Alcazar, Jóse L. Agreda, Maria Colino e Alex Fito.

Os quatro primeiros, apesar de terem estilos e narrativas diferentes, ao nível da temática têm vários pontos de contacto. Sergio Córdoba, muito próximo na idade e no traço ao nosso João Fazenda, começou autopublicar Freaks in Love onde nos conta a história de um grupo de adolescentes e as suas dúvidas existênciais e amorosas, mais tarde o comic viria a ser editado pela Subterfuge Comics, em 1999 foi-lhe atribuído o prémio de Autor Revelação pelo Salão de Barcelona, aí receberia o convite da editora Siete Monos para editar uma compilação dos seus trabalhos, Ojos. Juaco Vizuete aborda o mesmo tema centrando a acção numa universidade, em El Resentido, editado pela La Cúpula, mas apesar de ser um autor com qualidades inegáveis, demonstra que ainda não controla bem o estilo, existindo grandes diferenças entre o primeiro e o último número da série, deixando fugir muitas vezes o fio narrador, o que não foi um entrave para a imensa popularidade da série. O estilo de Calo, o verdadeiro nome é Juan Carlos San Róman, é o da linha clara, muito embora seja um autor produtivo, até 1992 não editou mais do que o nº um de muitas das séries que se proponha continuar. O primeiro comic a aparecer com regularidade Dios Los Cría surgiu apenas em 1999, pela Under Comics.

Já Javier Rodriguez, com um  estilo realista, estreou-se em 1994 com Love Gun, primeiro pela Cactus Comics e mais tarde pela Under Comics, uma série sobre as  aventuras de Patricia Love, uma rapariga desempregada que tenta encontrar trabalho em vários planetas, e onde também vai tendo algumas experiências amorosas, assina agora a série Tenebro ( a anterior foi Paraíso) na revista El Víbora. Próximo desta temática, mas eclético porque varia na escolha dos argumentos, temos Ramon F. Bachs, num estilo que resulta da fusão entre escola franco-belga e o manga, e que desenhou Manticore, pela Camaléon Ediciones, e Yinn, pela Planeta DeAgostini, onde podemos também encontrar outro trabalho seu, Saturn Babe.

Mais negros, surrealistas e com uma obra de carácter pessoal fortíssimo temos Paco Alcazar, num estilo que deve tudo a Daniel Clowes, desde o desenho à narrativa, passando pelo tipo de humor, muito embora abuse da repetição de quadrados e lhe falte alguma capacidade para imprimir movimento a algumas cenas, editou Porque te Gusta pela Subterfuge Comix, uma história que gira à volta de um homenzinho com um discurso desconcertante e hábitos menos próprios, um dos quais é manter relações sexuais com a filha. José Luis Agreda publica com regularidade na revista La Comictiva e tem uma tira regular na El Jueves e na U, El Hijo de Urich, além disso tem páginas e páginas assinadas por vários fanzines espanhóis, e recentemente publicou uma compilação de histórias curtas EH, Tu Chaval! na Under Comic, delirante. Maria Colino, ilustradora regular no El Mundo, publicando com alguma regularidade na El Víbora, podemos encontrar uma compilação de histórias curtas na Under Comics, Rabia Máxima, maria Colino tem o traço mais expresionista do conjunto, o que lhe permite ter alguma liberdade criativa na planificação. O último autor a conhecer é Alex Fito, já que não é espanhol, nasceu no México, mas mudou-se muito novo para o país vizinho, onde fez todos os seus estudos. Fito começou por publicar em fanzines, disso passou a colaborar com regularidade em revistas infantis, em 1999 publicou um comic book Raspa Kids Club, altamente inspirado em Chris Ware, quer no desenho quer na parte gráfica. Apesar de tudo, muito interessante.

Estes nomes, todos com idades compreendidas entre os 20 e os 25, demonstram que a bd espanhola está activa, capaz mesmo de acabar com a ideia em de que o meio Espanha está moribundo. Mais do que isso, percebemos através destes exemplos que uma indústria e política cultural nacional são feitas de raiz, tem várias etapas e objectivos claros. Não há desperdícios ou apostas pontuais.
 

Bibliografia Útil

Guia Basica Del Comic
Eric Frattini e Óscar Palmer
Nuer Ediciones
Apesar de generalista, este guia trata também autores espanhóis maiores contemporâneos como Manel, Miguelanxo Prado e Max.

Biblioteca Dr. Vértigo
Glénat
Num formato bastante portátil (aceite em qualquer sociedade shandy) a biblioteca do Dr. Vértigo é uma das colecções mais interessantes que existem, cobre quase todos os temas sobre a bd e cultura popular. Alguns títulos: La Historia en Los Comics, El Canon de Los Comics…

Livrarias

Norma
C/ Fluvià, 89
08019 Barcelona
www.norma-ed.es
Nas livrarias Norma conseguem encontrar os títulos mencionados, existe nas seguintes cidades: Barcelona (casa-mãe), Cambrils, Castellón, A Coruña, Girona, Granada, Hospitalet, Madrid, Málaga, Palma de Mallorca, Pamplona, Oviedo, Sabadell e Vigo. Além de livraria é também uma das grandes editoras espanholas.

Madrid Comics
C/ Silva, 17
28004 Madrid
Independentes autopublicados, fanzines obscuros e livros teóricos apócrifos, se não encontrar isto aqui, o empregado confessa tudo.

Freaks
C/ Alí Bei, 10
08010 Barcelona
Na rua com o nome do incrível Alí Bei, encontramos a melhor livraria de bd em Barcelona, não só disso mas também de cinema e ficção-científica. Tudo, independente ou não, e com um serviço simpático, bem informado e nada chato.

Editoras Independentes

La Cúpula
Plaza Beatas, 3
08003 Barcelona
www.lacupula.es
Responsável pela Brut Comix, que além de autores espanhóis publica também Daniel Clowes, Charles Burns, etc, etc.

TMEO
C/ Herreria, 54
01001 Vitoria
Revista e editora, responsável pela edição de nomes como Alvarez Rabo, Calvo e Patxi Huarte.

Subterfuge
Apdo. 46055
28080 Madrid
www.subterfuge.com/comix
Acaba de fazer 10 anos esta editora, que tem como principal actividade a edição de discos. Edita um fanzine que acaba por servir também como uma “catálogo” de autores, The Vault of Subterfuge , do qual acaba de sair o nº 26 com mais de cem páginas e onde podem ser encontrados algumas bds dos autores acima mencionados.

Universos Paralelos

www.dreamers.com
www.ciudadfutura.com
Muita informação, vendas, links para tudo quanto é sitío.

www.irc-hispano.com
#comics®
Porto: 6667
Animado chat sobre comics em geral, a fervilhar de fanáticos e tipos com graves problemas mentais. Ideal para quem quer ter uma boa discussão.

Museu del Còmic I La Illustració
C/ Santa Carolina, 25
08025 Barcelona
Este micro museu (montado numa garagem por um grupo de entusiastas reformados) vale a pena ser visitado, principalmente para quem é maníaco e com tendências masoquistas. Nota: a história da bd espanhola só vai até aos anos 80…
 

Paulo Patrício




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